Detesto a solidão
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amo, vejais, ser em andorinhas
ou pardais:
na altura do céu azul em edifícios
vidraças ou metais;
eu detesto a solidão
noentanto estou só
cá no meu quarto
cá no meu canto
sob o soturno manto
de aqui dentro de mim;
(quando a vida perecer
só nos resta de legado
amor ou melancolia;
isso eu afirmo porque
a brisa ou o sol do dia
não pode ser capturado,
guardado com avareza
ou então acumulado,
se a visível natureza
colore-se em céu nublado;
a brisa é fluida e vadia
o sol é imenso e vário;
é natural que a poesia
seja um soneto ao contrário)
eu não estou só
- constato -
nem mesmo no silêncio do meu quarto,
e nenhuma emoção
nasce de introspecção;
todo o que digo
tudo o que sei
é nuvem e brisa e sol
e dor e trago que herdei:
a flor dos olhos sonâmbulos
entorpecidos pela claridade
da certeza
que em minha testa brota;
a miragem do concreto que
cerra minha carne, mas
declina ante meu gemido;
a dor em minhas costas
subjugadas pelo peso
do tempo que exaure meus ossos,
presente do antes e do depois;
o que julgo meu sopro
desejo ou idéia, pois,
(que supostamente nasce)
revela-se, descartando o enigma,
deliberação d'uma assembléia
composta por vozes milhares
sob o semblante solitário
de minha face.
(Marcos Cruz)